Qual a relação entre obscurantismo e intolerância religiosa? Apesar do termo obscurantismo ser contestado por estar ligado ao período iluminista, o adotaremos justamente para assinalarmos a contribuição dos iluministas para a humanidade. Por um lado, vai longe à idéia de que a humanidade caminha para um futuro promissor por meio do avanço da ciência e da técnica. Por outro lado, no entanto, o legado dos iluministas não pode ser totalmente esquecido, sem corrermos o risco de mergulharmos no obscurantismo, no autoritarismo e no irracionalismo.
A contribuição dos iluministas para a humanidade é imensurável. O filósofo e escritor francês Voltaire (1694-1778) ícone iluminista, foi perseguido, teve seus livros condenados e escreveu belíssimas páginas sobre esse tema. Além do seu “Tratado sobre a Tolerância” (1762), ele abordou essa problemática também nas “Cartas Inglesas ou Cartas Filosóficas” (1734), em “O Túmulo do Fanatismo” (1736), no “Dicionário Filosófico” (1752) e em “O Filósofo Ignorante” (1766).
Para Voltaire a intolerância religiosa tem como principal fundamento a busca do poder, querer se impor como religião dominante, mas também as superstições e os preconceitos. “(...) É incontestável que os cristãos quisessem que a sua religião fosse a dominante. (...) A opinião deles era que toda a terra devia ser cristã, logo, tornaram-se necessariamente inimigos de toda a terra, até que a terra inteira se convertesse” (VOLTAIRE, 1978, p. 290). Visto que em matéria de religião não existe uma verdade absoluta, mas somente verdades relativas, Voltaire defende que o que garante a paz e a tolerância entre as pessoas é o respeito à diversidade de crenças e religiões: “Se entre nós houver duas religiões, hão de cortar-se o pescoço; se houver trinta, viverão em paz” (VOLTAIRE, 1978, p. 291).
No “Dicionário Filosófico”, no verbete “Tolerância”, Voltaire explica o que entende por tolerância. Ele pergunta: “O que é a tolerância?”, e responde: “É o apanágio da humanidade. Somos todos cheios de fraquezas e de erros; perdoemo-nos reciprocamente as nossas tolices, tal é a primeira lei da natureza” (VOLTAIRE, 1978, p. 290). E ele acrescenta: “Evidentemente que qualquer particular que persiga outro homem, seu irmão, porque não participa das suas opiniões, é um monstro” (VOLTAIRE, 1978, p. 291).